29 de jan. de 2011

UM ANJO DE CANDURA

De repente, dos meus olhos de pai surgem imagens que foram vividas há exatos dezoito anos. Todas límpidas, imaculadas. Com elas, veio-me todo esse passado como a que me apresentar uma nova história, distinta daquelas imagens, entanto recheada com o mesmo amor, a mesma felicidade.
Os pais são e serão sempre ungidos por essa graça maior: o nascimento de um filho. Um filho nasce toda hora, embora seja o mesmo. Um filho é a felicidade que se renova toda hora de forma atemporal. Os pais serão sempre livres em seus filhos, posto que a felicidade aí consista no renovar-se cada vez que se olha um filho.
Hoje, olho para a minha filha e lhe toco todos os traços infantis de quando a esse mundo chegou. Vejo-a ainda, pequenina, aninhada em meus braços... tão indefesa, tão necessitada dos meus cuidados e eu, olhando o mundo ao nosso redor, cuidava para que nada lhe assombrasse, nada maculasse seu mundo, nada perturbasse seu sossego, nada lhe fizesse sofrer. Era meu anjo pequenino, minha mais fervorosa oração e a messe dos meus dias. Meu lindo anjo de candura.
Se o mundo mudou esses anos todos, nesse momento não me interessa. O que importam os fatos que te tiraram dos meus braços, meu adorado anjo? A vida tinha que seguir seu curso; tu haverias de crescer e não seria em meus braços e nem sempre a minha presença poderia te proteger do vento forte, das agruras que te fariam derramar lágrimas e, tantas vezes, sem que eu estivesse por perto.
Dia desses, tu estavas fazendo quinze anos. Parece que foi ontem. Linda e tão feliz tu estavas naquela noite, rodeada pelos teus familiares, com esse sorriso meigo que é tua marca registrada. Contive minha vontade de irromper aquele recinto e te abraçar, beijar-te, dizer-te o quanto te amo! Talvez, naquele momento eu pudesse num olhar; pedindo perdão, sarar a dor da perda de um cachorrinho ocorrida seis anos atrás. Talvez. Ali, parado, apenas fiquei feliz por ver tua felicidade e sentir que este aniversário era mais importante do que aquele.
Meu anjo, como vês, muitas responsabilidade tens pela frente. A vida te cobra e urge atendê-la. Lembro-me de quantos planos eu fazia para quando eu completasse meus dezoito anos. Muitos pueris, mas quem não os teve? Quais? Ora, poder ir ao cinema sem a companhia dos pais; poder tirar a carteira de motorista, estar na faculdade, namorar, muito embora que escondido, em certos casos... fumar! Ah! No meu tempo era charmoso fumar. Ainda bem que, hoje, vocês são mais conscientes.
Vê bem, minha filha, esses exemplos são sonhos de liberdade que tínhamos devido à educação do nosso tempo, que hoje vemos o quão sábia. O nosso sonho de liberdade era puramente conceitual. Não ultrapassávamos nada que atingisse nossa honra. Era um tempo bom.
Fazes hoje dezoito anos. Em teus olhos leio a serenidade com que encaras essa nova idade. Há um misto de candura e maturidade nos teus atos que me faz perceber que sabes o que queres da vida. Sabes que nada é fácil, mas se torna quando se tem princípios, quando se tem uma educação fundamentada na verdade, quando se sabe respeitar e se fazer respeitar, e isso aprendeste com sobras, principalmente, com tua mãe, avó, tios e  irmão que hoje se reúnem para te homenagear.
Minha filha, neste momento reitero todo meu amor por ti, rendo-te todas as homenagens que posso e feliz estou por poder, hoje, abraçar-te, beijar-te, dizer-te o quanto te amo, assim olhando para ti, com os olhos marejados de emoção como a te pedirem desculpas pelo cachorrinho, porém, supondo que naquele instante em que sofreste a primeira decepção, tenhas aprendido, também, a conceder o teu primeiro perdão, como anjo de candura que és.

Feliz aniversário, minha filha

Fortaleza, 29 de janeiro de 2011     

Um comentário:

  1. Ô meu amigo...
    Realmente é difícil falar quando ouço o teu canto...
    Vem das entranhas...
    Vou ficar aqui caladinha... Mas só por um minutinho... Depois, quem sabe...

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